segunda-feira, 18 de maio de 2009

Velhas gavetas

Sempre haverá coisas interessantes escondidas em velhas gavetas. Coisas que nem lembrávamos mais, de tempos atrás.
Às vezes são cartas de antigos amigos, ou grandes amores, que a vida levou, e que os rumos diferentes foram, lentamente, fazendo-nos esquecê-los.
Fotos que ficaram perdidas e, sem terem álbum para guardá-las, caíram no esquecimento. Fotos de família – Ah, como eram legais aqueles domingos! E ficamos sentados na cama, lembrando e sorrindo.
Num fim de tarde qualquer em que a casa e a rua descansam, e nada temos a fazer, encontramos meio que sem querer um rabisco colorido no fundo da segunda gaveta de um armário. – PAI EU TE AMO! Naquela letra desajeitada de quem vive no próprio mundo de fantasias, enxergamos a nós mesmos, anos atrás. E as imagens vão aparecendo pouco a pouco...
– Como eu pude mudar tanto a ponto de não mais demonstrar o amor que sinto? O sentimento é o mesmo, eu é que estou diferente.
Continuamos nossa viagem. E parece que somos crianças novamente. Apegamo-nos firmemente às pequenas coisas. Papéis dobrados, amarelados. Algum CD que compramos algum dia, mas por acaso não nos agradou. Guardemos este para ouvir outra hora, e descobrir que nossos gostos também mudaram.
E quanto nós podemos aprender com aqueles recortes de jornal, que por algum motivo não-memorável teríamos guardado naquela gavetinha!
E a busca segue. À esta altura nem lembramos o que procurávamos no início, pois que encontramos tanto e aquilo (seja o que for) nem nos importa mais.
Uma lágrima escorre ao nos depararmos com um singelo poema escrito sem pressa alguma, talvez em uma aula chata ou em uma dessas tardes tediosas.
A nostalgia é incomparável, ímpar. Em uma única tarde visitamos vinte anos de história, e lembramos de inúmeras histórias.
Podemos perceber, quiçá, o algo pelo qual começamos a busca nas gavetas amontoadas. Lá num cantinho, bem tímido, encabulado, está um menininho (ou será uma menina?). Recolho a criança, que mais parece um ser fantástico, daquela velha gaveta e ponho-a sob o lençol. Está triste e sem jeito. Levanto seu rostinho miúdo, seus olhos brilham parecendo dois grandes oceanos, e pergunto-lhe o nome. Surpreendo-me ao descobrir que aquela criança, na verdade, sou eu próprio, ou o que era há certo tempo.
Agradeceu-me por tê-lo tirado do armário e contou-me muitas coisas que aprendera com aquelas fotos, e cartões, cartas... e todos o resto que anteriormente eu tinha encontrado.
Disse-me também que, enquanto eu vivia a correria da maturidade, sempre com muitos problemas a serem resolvidos; ele apenas esperava o dia de nos reencontrarmos. Emocionei-me demais naquela tarde chuvosa. Beijei a cabeça daquele ser e coloquei-o sob a cabeceira da minha cama, longe de qualquer prisão.
Hoje sou outra pessoa. Todos os dias eu brinco com aquela criança. Corro, grito, dou risada e caímos no sono, abraçados, pelo chão da sala. Juntos outra vez.

Aquela miúda criança, que mais parece um duende,
Mudou a minha vida de repente, e ainda muda todo o dia
Alimenta-se de alegria e
Tem por nome de Lembrança!

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