quinta-feira, 17 de março de 2011

Um beijo

   Ela sempre ia ao mesmo restaurante, ao mesmo bar, e fazia a mesma coisa. Era linda, mas escondia sua face com maquiagens pesadas e óculos que não precisava usar senão para ler. Seus cabelos eram lisos, sua voz rouca e seu olhar, simplesmente, avassalador. E ela fazia a mesma coisa. Sempre.
- Oi. Posso te pagar um drink?- perguntava o cavalheiro.
- Sim.- respondia, simpática.
- Um uísque para mim e um...
- Chardonnay...
- ...pra moça.
   O bartender já estava acostumado com a cena. Eles conversavam, e conversavam, e bebiam, e conversavam. Então, o cavalheiro diz algo em seu ouvido e ela balança a cabeça negativamente. Ele sai do bar sozinho, e ela fica ali. Sozinha.
   Outra noite, ela volta ao mesmo bar, do mesmo restaurante e faz a mesma coisa.
- O que vai querer?
- Beber, basicamente. Mas antes, saber o seu nome.
   Ele sorri e diz seu nome.
- Não quer saber o meu?- pergunta ela, com um ar misterioso e um certo charme.
- Não. Na verdade, não. Só quero deixar você bêbada.
   Os dois riem e, depois, conversam. E conversam, e riem. E ela faz a mesma coisa, no mesmo bar. E ele sai sozinho. E ela continua lá, a mesma.
   Até que, numa noite igual às outras, ela está lá no mesmo bar e um desconhecido se aproxima.
- Uma cerveja, por favor.
   O bartender serve cerveja ao moço e olha para ela, já sabendo o que viria.
- Não quer saber o que eu gostaria de beber?- diz, risonha.
- Não. Na verdade, não. Só quero tomar a minha cerveja e ir para casa.
   O homem atrás do balcão segura uma risada e continua secando os copos.
- É sério?- pergunta, incrédula e com ar de descepção.
   O cavalheiro larga o copo na mesa e a olha de cima abaixo.
- É.
- Você não quer nem ao menos saber meu nome? É casado, por acaso?
- Não... e... não. Mas se você faz questão...
- Não faço questão nenhuma!- responde a moça de modo bruto. Então levanta do banco e sai.
   Ele puxa ela pelo braço e a beija, como se aquilo fosse lhe salvar a vida. Ela retribui.
- Mas você...- começa a moça, ainda extasiada.
- Eu não quero pagar uma bebida pra você, por que não quero que você se altere. Eu não quero saber seu nome, por que não quero me apaixonar. Eu quero só você. Agora, não depois.
   O barman deixa cair um copo e o barulho desperta ela.
- E o que foi isso, então?
- Um beijo- responde o conquistador, sem pensar.
- Só um beijo?
- Só um beijo.
   E ele sai do bar sozinho. E ela fica ali, sozinha. Fazendo a mesma coisa, no mesmo bar do mesmo restaurante. Sozinha.

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